Este é o título de um livro escrito por Daniel Innerarity , catedrático de Filosofia Política e Social, Investigador Ikerbasque na Universidade do País Basco e director do Instituto de Gobernanza Democrática.
A sociedade de hoje é muito diferente da que existia no tempo da Revolução Francesa em que foram proclamados os valores da liberdade, igualdade e fraternidade. A Revolução industrial foi um período de desenvolvimento tecnológico causando grandes transformações na sociedade. Na Inglaterra os cartistas exigiram o sufrágio universal masculino. As modificações económicas e tecnológicas consolidaram o sistema capitalista e foi dado um passo para os governos democráticos.
Hoje temos uma sociedade complexa devido a problemas de vária ordem : degradação ambiental, e ecológica, crises económicas e financeiras, conflitos internos e externos, migrações entre países.. Uma sociedade complexa vai originar também uma democracia complexa. Em que os problemas não se resolvem com políticas simplistas mas com processos que envolvem peritos, especialistas, corporações e instituições. Na maior parte dos casos também requerem soluções a longo prazo que são incompatíveis com o mandato dos governantes eleitos por períodos de 4 a 5 anos.
Depois desta breve síntese passo a citar algumas passagens do livro:
A principal ameaça à democracia não é a violência nem a corrupção, ou a ineficiência, mas sim a simplicidade. A uniformidade, a simplificação e os antagonismos toscos exercem uma grande sedução sobre aqueles que não toleram a ambiguidade, a heterogeneidade e a plurissignificação do mundo. Os nossos sistemas políticos não estão a ser capazes de gerir a crescente complexidade do mundo. A democracia não é incompatível com a complexidade, antes pelo contrário. O seu dinamismo interno e a sua capacidade de autotransformação fazem dela o sistema de governo mais bem preparado para geri-la.
A primeira coisa que um conceito complexo de democracia nos ensina é que a democracia é um processo. Uma democracia de qualidade é mais sofisticada do que a aclamação plebiscitária: nela deve haver espaço para a recusa e o protesto, sem dúvida. Mas também para a transformação e a construção. Como evitar que o simplismo e a mera recusa sejam eleitoralmente tão rendíveis ? Façamos intervir no processo democrático mais valores, actores e instâncias.
Temos de aprender a mover-nos em cenários de maior instabilidade quando se trata de construir cidades e sistemas de energia inteligentes, prevenir conflitos, lutar com as alterações climáticas, combater a pobreza , a instabilidade financeira, a degradação ambiental ou gerir as crises. O actual incremento da complexidade exige uma profunda revisão das nossas concepções da democracia e das nossas práticas de governo.
Na era da globalização, as condições em que os seres humanos vivem são mais complexas e inabarcáveis. O caos e a auto-organização surgem segundo as lógicas dos sistemas dinâmicos complexos, tanto na natureza como na sociedade. O objectivo do governo consiste precisamente em criar um ambiente em que a sociedade possa reflectir acerca daquilo que quer para si própria.
A sociedade é complexa pelo aspecto que nos oferece( heterogeneidade, discordância, caos, desordem, diferença, ambivalência, fragmentação, dispersão). Pela sensação que produz ( incerteza , insegurança ) e por aquilo que se pode fazer ou não com ela ( ingovernavilidade,inabarcabilidade ). Os maiores desafios do futuro têm a ver com as transformações repentinas ou «catástrofes normais »
A sociedade democrática é atravessada por diferenças de opinião, de classe e de interesse que tornam duvidosas todas as tentativas de identificar uma vontade inequívoca do povo . A democracia é uma forma de organização política da sociedade em que o conflito nunca se resolve definitivamente na unidade de uma vontade comum. Na UE não há um poder central que deva ser conquistado numa competição entre partidos políticos, nem as políticas são decididas por um governo maioritário mas sim por uma negociação entre o Conselho, o Parlamento e a Comissão. Governar é uma acção incerta, difícil e aberta ao fracasso. A política intervém numa sociedade em que existem diversos sistemas ( económico, legal, ambiental científico) . Cada um desses sistemas tem um conjunto de valores, semânticas, racionalidades, preferências e interesses que não coincidem completamente com o dos outros. Numa perspectiva indirecta governar consiste em facilitar a reflexão desses sistemas autónomos para que eles mesmos descubram as suas possibilidades catastróficas e se protejam delas com algum tipo de autolimitação A força do governo não consiste em obrigar o povo a fazer alguma coisa , mas sim numa autoridade que anime o povo a fazer o que convém ao bem comum. Uma democracia de transformação tem de realizar 3 tipos de operações: 1- gerar a mudança social proposta. 2- evitar situações indesejáveis que devem ser previstas para não ocorrerem. 3- configurar uma subjectividade capaz de construir e implementar essas decisões políticas o que passa necessariamente pela negociação democrática, pelo pacto ,pelo acordo e pela cooperação. Não há democracia sem uma opinião pública que exerça um controlo efectivo sobre o poder, expresse as suas críticas e faça verdadeiramente as suas exigências. A crescente complexidade do político torna difícil que haja uma opinião pública competente para entender e julgar aquilo que está a acontecer. As democracias devem abrir-se aos outros contemporâneos (transnacional), às gerações futuras(intergeracional), à igualdade de género( paritária) e às questões ecológicas e deveriam também completar aquela que é agora uma reduzida democracia eleitoral. As democracias eleitorais têm um viés sistemático a favor do presente e menosprezam o futuro, ou seja, tendem a pôr os interesses dos eleitores actuais acima dos eleitores futuros. A política ambiental e as alterações climáticas deve ser compatível com a democracia; se não for, além duma ameaça contra o ambiente físico teríamos uma ameaça contra a nossa forma de viver civilizada.. Não há fórmula alternativa à democracia representativa que garanta melhor o pluralismo e a equidade. A função das instituições numa democracia representativa é dupla: 1- inclusão do maior número possível de pontos de vista e interesses no processo político e 2- ponderação do peso real desses pontos de vista e interesses, corrigindo as sua assimetrias. As democracias não estarão em condições de responder aos desafios com que se confrontam se não melhorarem os seus recursos cognitivos. As democracias são os sistemas políticos mais inteligentes, mas são também aqueles que exigem que se desenvolva mais inteligência colectiva se quiserem manter os seus padrões de legitimidade. A política está concentrada no curto prazo e rege-se pela lógica dos períodos legislativos e do calendário eleitoral, o que, associado à aceleração eleitoral a leva a actuar quando as coisas não têm remédio, a legislar sobre o passado, a praticar gestos de soberania que não têm nenhuma eficácia. Nas sociedades modernas, os actores e sistemas sociais devem ser capazes de funcionar como totalidade complexas que interagem e não como mera agregação de elementos. Vivemos numa época que podemos caracterizar pela volatilidade. A volatilidade manifesta-se na imprevisibilidade que faz fracassar as sondagens, na instabilidade permanente, nas turbulências políticas, nas disrupções de toda a espécie, na histeria e na virilidade. Se até há pouco catalogávamos as pessoas como liberais, conservadoras, socialistas ou comunistas, agora deveríamos agrupá-las em desconcertadas, voluntaristas, oportunistas, indiferentes ou Irritadas. A grande politização que nos espera é a do mundo digital. Hoje podemos garantir que no século XXI. a política é precisamente isso: a institucionalização de um nível de reflexibilidade para que os nossos dispositivos automatizados sejam desenhados de acordo com aquilo que decidimos ter , uma vida comum bem sucedida. Cada época histórica tem uma forma de governo. O mundo actual deve ser governado de acordo com o seu nível de complexidade. Que tipo de democratização pode ser levado a cabo neste plano global ? Para uns, a solução seria fortalecer os vínculos entre as estruturas domésticas e as internacionais, enquanto os cosmopolitas reclamarão que se avance no sentido de dotar essas instituições globais de propriedades dos estados ( lógica parlamentar e opinião pública unificada». Em ambos os casos prevalece o modelo de Estado nacional, bem como o governo de legitimidade democrática, bem como a aspiração de que as estruturas globais se vão parecendo o mais possível com o Estado nacional. É pouco realista pensar em transplantar as categorias da democracia próprias do Estado-nação para os processos da União Europeia e, mais ainda, para a governança global. O que é razoável é entender que nos processos globais » há pouco lugar para a democracia, mas muito espaço para a legitimidade ». A este nível, a questão da legitimidade tem mais a ver com os requisitos da justiça do que da democracia. Num mundo interdependente, com várias formas novas de autoridade não democrática, é muito inverosímil que a democracia possa existir apenas a um nível, seja ele nacional, global ou transnacional. Tomar o Estado nacional por única realidade possível para o exercício da democracia e por modelo universal equivale a considerar uma das suas concretizações históricas como a única possibilidade de democratização. Que a democracia moderna tenha encontrado a sua forma no Estado nacional não quer dizer que não possa acontecer sob um formato diferente, ou em condições muito diversas. Fazer da democracia uma realidade mais complexa implica ter em conta essa dimensão global em que a nossa vida colectiva se desenrola, nesse contexto de crescentes interdependências.. Se a política é articulação das formas de viver em conjunto do que se trata agora é de como devemos conviver, de que forma nos organizamos e quais as nossas obrigações recíprocas no contexto das profundas interdependências geradas pela globalização. No fundo, o problema não é se, nos âmbitos globais, pode ou não haver uma democracia semelhante aquela que configuramos nos estados nacionais, mas sim como superar a incongruência entre os espaços sociais e os espaços políticos. O fundamental é que haja governo ou governação legítimos, e não tanto que possam ou não estender-se globalmente os requisitos democráticos que só são válidos ,estritamente falando, para os espaços delimitados. Nesse sentido, as instituições internacionais tornam possível que a política recupere a capacidade de actuação face aos processos económicos desnacionalizados.
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