Quarta-feira, 10 de Julho de 2013

PACIÊNCIA COM DEUS

1-O último livro que acabei de ler tem por título “ Paciência com Deus “ ( Oportunidade Para Um  Encontro ),  e é seu autor o Padre Checo Tomás HalíK. É um livro que ajuda a meditar e a reflectir sobre temas que têm a ver com a fé em Deus. Gosto particularmente deste tipo de literatura que obriga a pensar como a filosofia e prefiro gastar o meu tempo desta maneira do que envolver-me profundamente no mundo das trivialidades, das intrigas e  das politiquices (salvo raras excepções ) do FacebooK ,ao qual já estive para fechar as portas definitivamente.

No livro “ Paciência com Deus “ aborda-se precisamente questões que nos deixam a todos nós, sobretudo aos crentes, sem uma resposta. Se Deus é infinitamente bom e omnipotente por que razão permite o sofrimento, as vítimas inocentes, as guerras, as catástrofes, as doenças, a misérias, a fome ,etc.. É claro que somos tentados tal como Leibniz, a fazer uma justificação racional de Deus ( Teodiceia ). Deus criou o homem livre e capaz de praticar tanto o bem como o mal. Os homens não podem ser marionetes comandadas por um  “deus ex machina “.Os violentos temporais que hoje são frequentes um pouco por todo o lado não serão consequência do desrespeito do homem pelo meio ambiente? Quanto às catástrofes naturais, como terramotos , seria possível um mundo habitável pelo homem sem estes fenómenos naturais ? Eu não iria tão longe como Voltaire que  no livro “ Cândido “ perante o desolador terramoto de Lisboa de 1755 põe na boca de Pangloss  a seguinte expressão : “ Tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis “.

2-O Padre Tomás Halík surpreendeu-me pela sua frontalidade pois aborda a religião pelo lado mais difícil que é explicar a paciência com Deus. Logo na introdução do livro diz o seguinte: “Perante o bulício mercantil de artigos religiosos de todo o género, eu, com a minha fé cristã, por vezes, sinto-me mais próximo dos cépticos, dos ateus, dos agnósticos, críticos de religião.Com certo tipo de ateus partilho um sentimento de ausência de Deus no mundo. Contudo, considero a sua interpretação de tal sentimento demasiado precipitada, como que um expressão de  impaciência. Muitas vezes sinto-me oprimido pelo silêncio de Deus e pela sensação do afastamento divino. Percebo que a natureza ambivalente do mundo e dos inúmeros paradoxos da vida pode dar origem a expressões como “ Deus morreu “, para explicar o ocultamento de Deus.

Para o Padre Tomás Halík as três vias que conduzem a Deus são :  a fé, a esperança e o amor. Mas esta tríade de nada vale se não estiver alicerçada na paciência. Assim, a fé, a esperança e o amor têm de ser pacientes. Todos nós nos momentos de infortúnio sentimos a ausência de Deus e nos revoltamos perante a dor e o sofrimento. Também Santa Teresa de Lisieux e a irmã Teresa de Calcutá passaram por momentos difíceis e de trevas no fim da vida. Conforta-nos porem a ideia de que Jesus Cristo que era filho de Deus e assumiu a nossa humanidade, aceitou voluntariamente o sofrimento  e exclamou na cruz :  “ Meu Deus, meu Deus porque me abandonaste “

3-O primeiro capítulo começa com o conhecido episódio narrado no evangelho São Lucas( 19-1,10 ) e em que Zaqueu o cobrador de impostos, de baixa estatura, sobe a um sicómoro para melhor observar Jesus . Ao vê-lo Jesus mandou-o descer e disse-lhe que iria ficar em casa dele. Zaqueu prometeu dar metade dos seus bens aos pobres e no caso de ter defraudado alguém restituir quatro vezes mais. Este episódio vem revelar que Jesus dedicou especial atenção aos marginais da sociedade do seu tempo: pecadores, pobres, leprosos, doentes, prostitutas.Eram estes os que precisavam de mais ajuda para se salvarem.  Não eram os sãos que necessitavam de médico mas os doentes. Mas Zaqueus, ou seja, pessoas que buscam e procuram a verdade vamos encontrá-los também no grupo dos ateus. Tomás Hálik divide os ateus em dois grupos : ao ateus apáticos e os ateus apaixonados. Os apáticos são indiferente e não revelam qualquer interessse por Deus.  Apáticos são também alguns cristãos para quem lhes basta conhecer os dogmas e não se preocupam em dar testemunho da fé. Noa ateus apaixonados há também os que buscam Deus mas não o encontram nas religiões e nas instituições existentes. São ateus em relação a um Deus que não existe. Há também os que buscam a verdade , a justiça e o amor mas não o fazem como sendo uma busca religiosa ou uma busca de Deus. É com este dois grupos de ateus que os cristãos devem dialogar e intercomunicar trocando experiências.Por fim existem ainda os ateus apaixonados que protestam e atacam com ódio a religião. Nestes  há porém uma incoerência. Se para os ateus Deus não existe como se preocupam em  atacar com tanta raiva um Deus que não existe.

4-O padre Tomás HalíK despertou a sua vocação no período de ocupação comunista e por isso teve de viver na clandestinidade. Impressionou-me pelo facto de dizer que o cristianismo por ser uma religião de paradoxos ( os primeiros serão os últimos e os últimos os primeiros;o filho pródigo que é abraçado pelo pai quando regressa a casa; o trabalhador que vai para a vinha no fim do dia e recebe tanto como os que foram logo de manhã ; quem quiser ganhar a vida há-de perdê-la e quem a quiser perder pela causa de Cristo há-de ganhá-la ).    Por outro lado um Tomás Halík diz que um sacerdote não deve preocupar-se com o espectáculo mas servir quem precisa de ajuda. Não é dos autoconvencidos que se deve gastar tempo mas com os que buscam a verdade e ainda não a acharam.  Para ele São Paulo sabe apenas da Páscoa, morte e ressurreição de Jesus. Mas a ressurreição não pode ser vista apenas no esvaziamento do sepulcro, nas aparições e nos vestígios da ressurreição.  A ressurreição deverá ser para os cristãos como o assumir de uma nova vida.

5-No fim do livro Tomás Halík retoma o episódio de Zaqueu e procura explicar  o que se deve entender por paciência com Deus. Nada melhor do que transcrever as sua palavra:  “ A paciência que praticamos frente aos enigmas constantes da vida, resistindo à tentação de desertar e de recorrer a respostas simplistas, é sempre a nossa paciência com Deus, que não se mostra “ acessível “. Mas que é a fé, senão essa abertura ao ocultamento de Deus. No Cristianismo é impossível separar a fé da esperança… e a paciência é o seu atributo e fruto comum. Se Deus usa dessa paciência connosco, poderemos recusar-lhe a nossa  própria paciência da fé, da esperança e do amor, com todas as limitações da fragilidade humana…em momentos de vazio e escuridão, em que não há outra alternativa senão esperar ou desertar do caminho da esperança ?

6- Como complemento e adenda ao que ficou dito vou citar algumas passagens mais significativas do livro :

A fé religiosa- A verdadeira fé religiosa na terra nunca pode terminar, como se fosse uma busca bem sucedida de um outro objecto-   ou seja encontrando-o tomando posse dele- porque não se orienta para um fim material, mas para o coração do mistério, que é inesgotável como um poço sem fundo.

A fé cristã- ao contrário da religiosidade natural e da religiosidade despreocupada - é uma fé  ressuscitada, uma fé que tem de morrer na cruz, de ser enterrada e de voltar à vida de uma forma nova.

Os paradoxos da Bíblia-“ Deus é um mistério impenetrável “ ( Ele habita uma luz inacessível ) mas também Deus e o homem são semelhantes ( Deus criou o homem à sua imagem e semelhança )

Onde está Deus-  Deus está na nossa oração, nos nossos anseios, na nossa busca e nas nossas próprias interrogações. Deus está neste mundo e na nossa linguagem

Algoismo-é a religião mais difundida nos nossos dias e cujo credo é : “ eu posso não acreditar em Deus mas tem de haver alguma coisa acima de nós “

A Igreja como bode expiatório-há uma tendência para fazer da Igreja o bode expiatório e a principal causa dos nossos problemas na vida religiosa, muito semelhante à tendência para responsabilizar os pais e a sociedade, etc.  por todas as faltas e problemas dos jovens-

Fé e razão-A fé sem interrogações críticas transforma-se numa ideologia enfadonha. No entanto a racionalidade sem impulsos espirituais e éticos que brotam do mundo da fé, tornar-se-ia igualmente paralisante e perigosa.

Críticas que podem ser estimulantes-Eu gosto de críticos provocatórios da religião com Nitzche, cheios de ideias originais e brilhantes, provocando novas formas de pensar a fé.

Onde está Deus-Mas onde é que está Deus quando não há amor, quando só há crueldade, dor, pecado, sofrimento ? Ele está presente na fé e na esperança paciente daqueles que em tais situações, não se deixam ultrapassar pelo mal

O cansaço da fé- O cansaço da própria fé leva as pessoas a procurar actividades vorazmente oferecidas por vários movimentos religiosos, em particular aqueles que tentam afogar as interrogações racionais com calorosas emoções e com poder persuasivo de manifestações de massa ( milagres , curas espectaculares em estádios, que constituem expressivas reminiscências daquilo que Satanás tentou que Jesus fizesse no deserto.

Amor de Deus- O amor de Deus “ é pouco transparente e irracional porque transcende a lógica da lei. É uma “ loucura “ não podendo ser entendido pela  “razão “ mas apenas pelo amor de retribuição. A razão do legalismo religioso não é compatível com  Deus.

Deus é desconhecido pelo facto de ser tão próximo- Não nos apercebemos do ar que respiramos. Não vemos a luz em si, só as coisas iluminadas. Nem vemos o nosso rosto mas apenas o seu reflexo no espelho. De igual modo só podemos ver o rosto de Deus no espelho…e esse espelho segundo São Paulo é Jesus, ou antes é a sua história da Páscoa. Paulo não conhece nada a não ser Jesus crucificado.

Onde está Jesus ressuscitado- Jesus está presente no pão e vinho da eucaristia mas “  também nós podemos tocar as suas feridas nas cicatrizes ainda por sarar do corpo e alma dos nossos vizinhos que sofrem.

O perdão de Deus-Nós acreditamos que o perdão de Deus é um dom da graça, concedido de forma gratuita e sem a pressuposição de mérito e que só é necessário expor-lhe o nosso coração

Quem é que Jesus aceita no juízo final-  Deus aceita a fé implícita e anónima, manifestada através de actos de misericórdia, ao serviço dos sofredores e dos necessitados, a fé daqueles que, como diz o apóstolo São Tiago, demonstrarão a fé que têm pelas suas obras. É óbvio , pela descrição de Jesus que os justificados também incluirão aqueles que não realizaram esses actos especificamente por causa dele, que não têm qualquer motivo  “piedoso “- fazem-no apenas pelos sofredores em si.

 

Francisco José Santiago Martins

 

publicado por pontodemira às 17:30
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