1-Para o político francês André Malraux o século XXI ou seria religioso ou pura e simplesmente não seria nada. Parece que os seus vaticínios não estão a sair certos pois os movimentos ateístas têm-se multiplicado e tentam por todos os meios confundir as pessoas sobretudo os indiferentes ou aqueles para quem a religião lhes passa ao lado. É um facto que as igrejas se estão a esvaziar e isso é notório no que diz respeito aos mais jovens.
O filósofo francês Michel Onfray, autor dos livros “Tratado de Ateologia” e “Potência de Existir- Manifesto Hedonista “ , deu à Revista Visão uma entrevista na qual declara o seu ateísmo e entusiasma os que são crentes a abandonar Deus. Do mais importante passo a citar o seguinte: “ Só num Mundo sem Deus é que o Homem é livre. A queda das ideologias fez com que muita gente se reencontrasse no religioso. Em nome de Deus fizeram-se cruzadas, numerosas guerras e a Inquisição. Se Deus não existe, como acredito, não é preciso uma moral fundada na eternidade. Nas religiões monoteístas há um ódio às mulheres, aos homossexuais, à inteligência e à razão, aos prazeres do corpo, aos desejos e às pulsões. Quando se vive sob o olhar de Deus, não se é livre. Quando se age em função de ser salvo ou condenado, de ficar eternamente no Paraíso ou no Inferno, vive-se na inquietação. Tudo o que acontece é por vontade ou decisão de Deus. E por fim termina dizendo que o “ hedonismo é a arte de ser feliz “.
2-Discordo inteiramente do filósofo Michel Onfray pois o seu raciocínio assenta em premissas erradas.
Em primeiro lugar Deus não é nenhum tirano ou Big Brother que ande por toda a parte a vigiar-nos para nos punir implacavelmente. Pelo contrário Deus é Amor, cheio de misericórdia e sempre pronto a perdoar. Se Jesus Cristo disse para perdoarmos 70X7 então o perdão de Deus ultrapassa tudo o que se possa imaginar.
Em segundo lugar Deus criou-nos livres e portanto capazes de praticar o Bem e o Mal. Mas a liberdade não é cada um fazer o que bem lhe apetecer sem sujeição a regras. Há normas éticas e comportamentos morais que ninguém nem mesmo ateu poderá pôr em causa. O filósofo Kant dizia : “ Age de modo que a tua vontade possa valer como lei universal “ A norma moral é assim um imperativo ( Faz isto ) e categórico ( não deve haver razão nenhuma especial para o fazer ). Mas Kant que era agnóstico, vai mais longe e explica que se o Bem nem sempre é recompensado neste Mundo terá de haver outra vida depois da morte onde se possa fazer justiça e a virtude possa ser premiada. Isto pressupõe claramente a existência de Deus. Se Deus escapa ao nosso conhecimento só pela Razão Práticas lá poderemos chegar.
Em terceiro lugar a felicidade pode ser encarada de diferentes maneiras. Enquanto para um crente ela se alcança na virtude , na solidariedade e no amor ao próximo para um hedonista como Michel Onfray só desfrutando a vida se consegue ser feliz. Também o existencialista Sartre entendia que o homem só é verdadeiramente livre se não ficar preso a normas morais ou religiosas que condicionam negativamente a alegria de viver. Estão assim em jogo duas concepções diferentes da vida: uma altruísta de desprendimento e inter-ajuda e outra egoísta que apenas pensa no prazer físico. O Paraíso e o Inferno começam a construir-se aqui na Terra consoante nos inclinamos para o Bem ou para o Mal.
Em quarto lugar Deus não pode ser invocado para praticar o Mal. As cruzadas ,a Inquisição, as guerras de forma alguma se podem justificar e muito menos tendo o apoio e a cobertura de Deus. A Igreja já condenou todos esses crimes e crueldades que desvirtuam por completo o espírito cristão ou sentido religioso de qualquer crente. Como diz o Padre Anselmo Borges ( 1)” as vertentes da Religião boa são: a mística-paixão por Deus e a ética- compaixão por todos. A mística sem ética é ilusória, como a ética, sem a religião no limite, corre o risco de ficar cega. Não há, pois, lugar para o fundamentalismo nem para o choque de religiões “
No Antigo Testamento aparecem de facto apelos à guerra e à violência. Estes textos não podem, no entanto, ser interpretados de forma literal ou fundamentalista. Os textos foram inspirados em Deus, mas de forma alguma foram ditados por Deus. Os autores, no seu tempo histórico, concebiam Deus de uma determinada maneira que não escandalizava ninguém. A ideia de Deus foi evoluindo até chegarmos ao Sermão da Montanha em que Jesus Cristo diz : “Bem -aventurados os mansos porque possuirão a Terra.”
"Bem-aventurados os pacificadores porque serão chamados filhos de Deus "
Por último, na religião cristã não se fala de ódio às mulheres, aos homossexuais, à inteligência e à razão, aos prazeres do corpo, aos desejos e às pulsões. As religiões não podem incitar ao ódio pois como já ficou dito Deus apela ao Amor como está expresso no 1º Mandamento ( Amarás a Deus e ao próximo como a ti mesmo ). Por outo lado a fé não pode ser cega e por isso tem de se apoiar na inteligência e na razão. Não há qualquer contradição entre fé e razão nem entre ciência e religião. O facto da Igreja não concordar com a homossexualidade não quer dizer que odeie os que são homossexuais. Quanto à discriminação da mulher ela é mais evidente na religião muçulmana. Na religião cristã criou-se por vezes a ideia de que S.Paulo discriminava as mulheres o que não corresponde à verdade. S.Paulo não fazia qualquer distinção entre homem e mulher. Ambos eram iguais em Jesus Cristo. Algumas cartas, as pseudopaulinas, não foram escritas por ele e são sobretudo essas que colocam a mulher numa relação de subserviência em relação ao homem.
3-Para finalizar este tema gostaria de dizer que crentes e ateus embora afastados no que diz respeito à crença em Deus podem até estar próximos no comportamento ético, no espírito humanitário e filantrópico. O ateu até pode estar bem perto de Deus sem o saber. Nada melhor para concluir do que as palavras do padre anglicano Keit Ward (2) que passo a citar: “ A prática religiosa é, ou deve ser, uma prática de formação do eu na virtude, na justa excelência de ser uma pessoa verdadeiramente humana…… Se Deus nos incomodar, esqueçamos Deus, e pensemos em adoptar uma estratégia de formação do eu que veja a vida humana à luz de valores cujo mérito é eterno. Um ateu intelectual, alguém que nega que Deus é uma pessoa sobrenatural, pode orar desta forma. “
Anselmo Borges- Janela do Infinito , pág.216
Keith Ward- Deus e os Filósofos,pág. 247
FRANCISCO MARTINS
. SONHEMOS JUNTOSO- CAMINHO...
. O REGRESSO DA ULTRADIREIT...
. A TERRA INABITÁVEL-Como v...
. CARTA ENCÍCLICA: FRATELLI...
. A Democracia em decadênci...
. BOA ECONOMIA PARA TEMPOS ...
. TUDO O QUE NÃO VEMOS- ZIY...
. MARCO AURÉLIO- IMPERADOR ...